quarta-feira, 20 de abril de 2011

Um minuto de Silêncio


Final de semana, domingo dia de assistir a um jogo de futebol. Para alguns, cultura inútil que em nada acrescenta. Eu não penso assim, acho que a gente consegue aprender observando qualquer situação, ou vendo qualquer coisa na TV, por exemplo, até mesmo o Big Brother. É sempre uma aula de antropologia ver primatas evoluídos, trancafiados e sendo observados vinte e quatro horas por dia. Ver que o comportamento é sempre padrão. Divisão em grupos, conflitos, machos alfa, o que mostra que não somos tão diferentes assim dos chimpanzés, não é mesmo? Só que como somos mais inteligentes, também nos tornamos mais letais.

Antes de iniciar a partida pelo campeonato paulista, o árbitro pede que os jogadores se dirijam para o círculo do meio campo para que seja respeitado um minuto de silêncio, em homenagem às vítimas do terremoto no Japão. A homenagem é anunciada nos autofalantes do estádio, para os torcedores que entusiasmados gritam palavras de ordem, mostrando o seu amor pelo time do coração. O “minuto de silêncio” ocorre e é totalmente ignorado pela torcida que continua ovacionando o seu time. Assim também acontece durante a execução do hino nacional.

Como o jogo estivesse monótono eu comecei a zapear. Nada de interessante na televisão, que maçada! Até que me deparei com uma partida pelo campeonato inglês. Antes do início, um cenário bem parecido com o do nosso. A torcida animada, só que mais vestida por causa do rigor do inverno europeu. Então o juiz apita para que os participantes guardem um minuto de silêncio, não sei se pelo mesmo motivo. Silêncio total no estádio! Poderia se ouvir tranquilamente o choro de uma criança. Mas nem isso. Até chamei meu filho para assistir e comparar os dois eventos.

Foi só um exemplo para ilustrar um pensamento que eu sempre compartilho quando dialogo com as pessoas sobre civilidade que para mim pode ser resumida como “a arte de não furar fila e não jogar lixo na rua”.

Nós brasileiros como povo somos lamentáveis. Há muito que evoluir...

Eu proponho agora para quem estiver lendo este texto, um minuto de silêncio e reflexão sobre a nossa falta de civilidade/educação.

Agnaldo Garcia

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Os Ombros Suportam o Mundo



Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.


Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.


Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teu ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo,
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.

Carlos Drummond de Andrade

sábado, 16 de abril de 2011

O Quarto

“Eu não acredito em fantasmas. Mas tenho medo deles.”

Lord Byron

Lembro como se fosse hoje. Ainda me dá calafrios, um estremecimento gelado que sobe pela espinha e apalpa o estômago. Uma contração involuntária do corpo querendo se ajeitar na cama, em posição fetal, ante o terror da lembrança e a mente convulsionando em busca de explicar em vão o inexplicável. Ao mesmo tempo, em função desta minha mania de enxergar o copo sempre meio cheio, tal episódio sedimentou-me no íntimo do espírito a fé inabalável de que a vida segue em frente depois que a carne fenece.

Poderia dizer que sentia arrepios nos últimos dias quando atravessava o corredor que dava para os quartos da casa. Mas pode ser a minha imaginação me pregando peças, querendo juntar fatos desconexos que a nossa mente lógica teima em transformar sempre em padrões. Eu e minha sobrinha Eulália tínhamos acabado de assistir a um filme na TV e íamos dormir. A casa antiga, do início do século XX possuía assoalho de madeira de modo que quando a gente andava, o chão rangia levemente sob nossos pés. Em qualquer hora do dia seria impossível perceber o leve rangido, mas àquelas horas da noite com o silêncio absoluto que reinava depois que a TV fora desligada, o barulho parecia alto o suficiente para causar apreensão e aguçar a imaginação de uma mente supersticiosa. Para chegar até nossos quartos, tínhamos que atravessar o corredor até o final e passar pela porta do quarto de meus pais e depois pela de minha irmã Fernanda e eu sempre fazia este caminho à noite ás vezes sozinha, quando a insônia me perseguia.

A luz tênue de uma lâmpada incandescente de 40 watts dava um ar sombrio ao corredor àquelas horas da noite. Pra não ajudar, ainda comecei lembrar os “causos” arrepiantes que o meu avô Joaquim contava às vezes à beira da fogueira no sítio só pra que as sombras produzissem figuras fantasmagóricas e desse um grau maior de credibilidade às suas palavras. Não sei por que nesta hora, me veio à memória de um caso que ele repetia inúmeras vezes como emérito contador de histórias que era. Um dia, ele e um de seus compadres foram passar a noite em um local onde iriam trabalhar. Instalaram-se numa casinha simples de madeira com teto de algum tipo de fibra vegetal, onde é claro não havia luz elétrica. O ambiente só era iluminado por uma tênue lamparina, que eles haviam levado entre as tralhas de trabalho. Após o jantar simples preparado em uma fogueira improvisada regado a uma boa conversa, apagaram a lamparina e foram dormir. Meu avô disse que já estava dormindo há um bom tempo, quando acordou à meia noite, com uma forte luz que vinha de fora, e foi entrando pela choupana, iluminando completamente um pequeno cômodo que dava de frente para o quarto. Então, tremendo de medo, ele se cobriu dos pés à cabeça com o lençol, mas mesmo assim continuou a ver a luz, que estava cada vez mais perto de sua cama. Apavorado com esse fato, começou a rezar e como último recurso disse num tom de voz entrecortado e trêmulo:

___Se o que estiver ai não for coisa desse mundo, se afasta de mim que eu não resisto!

Segundo meu avô, após esta súplica a luz instantaneamente se apagou e a cabana escureceu completamente. No outro dia ele contou a história para os companheiros que haviam dormido tranquilamente à noite inteira e riram dele, dizendo que ele não deveria ter trazido cachaça escondido e que fora muita falta de consideração da parte dele ter bebido tudo sozinho.

Engraçado como funciona a cabeça da gente, porque todas estas lembranças inundaram a minha mente num espaço tão curto de tempo, quando eu apenas havia dado dois ou três tímidos passos em direção ao corredor. Neste intervalo ainda pensei em algumas histórias que meu pai, outro bom contador de causos relatara de visões que tinha tido naquela casa ou de quando ouvira cadeiras na sala ou o sofá sendo arrastado de madrugada.

E eu dizia para mim mesma apavorada:

___Nunca mais! Nunca mais ficarei até tarde vendo TV na sala!

Minha sobrinha também muito assustada agarrada ao meu braço, instintivamente mantinha os passos um pouco atrás dos meus. E aquele corredor nunca pareceu tão comprido!

Ao passar pelo quarto de minha irmã, a porta pareceu bater levemente, como se uma brisa a tivesse empurrado, mas o curioso é que meu subconsciente registrou certo sentimento de medo, que eu não deixei aflorar. Na hora não o percebi creio eu, mas refletindo agora posso dizer que o sentia. Quando finalmente chegamos à porta do quarto despedi-me de Eulália e pulei rápido sob os lençóis ainda trocando de roupa, enquanto podia ouvir os movimentos dela e ver por baixo da porta a luminosidade da lâmpada acesa de seu quarto. Agradeci a Deus por ser mais ágil, e imaginei que a pobre deveria estar mais apavorada do que eu.

Custei algum tempo para pegar no sono. Dormi pouco se bem me lembro, quase nada. Oscilei entre a total consciência dos sentidos e aquele período que antecede ao sono e se está entre acordado e quase dormindo, quando ainda se pode perceber os sons à nossa volta e aos quais, às vezes, incorporamos à algum sonho. Neste prelúdio meus ouvidos atentaram para um barulho incomum àquelas horas da madrugada. Despertei do estado de sonolência e apurei os ouvidos buscando entender o que se passava. O som parecia vir do quarto de minha irmã. A cama dela parecia ranger como se estivesse sendo insistentemente arrastada. Irritada por ter sido tão inconvenientemente trazida do sono, eu balbuciei entre um bocejo e outro: "Caramba, que tanto a Fernanda arrasta este raio de cama?". Pensei em levantar e ir até o quarto dela para verificar o motivo de sua inquietação, mas fui desencorajada pela sonolência e o meu medo do escuro. Entorpecida, virei para o lado e em poucos segundos adormecia novamente.

Não sei precisar quanto tempo se passou. Talvez quinze ou trinta minutos, já que quando dormimos o tempo decorre num ritmo diferente da vigília, mas acordei novamente de súbito, desta vez com a voz da minha irmã chorando e batendo desesperadamente na porta do quarto onde dormiam os meus pais, suplicando por ajuda. Ela gritava em alto e bom som que um espírito a estava perturbando! Firmei os olhos e olhei para o mostrador do despertador antes de deixar o quarto buscando abrigo na companhia dos meus familiares. Era meia-noite!

Todos se levantaram apavorados. Eulália, segurando minha mão, chorava de medo. Suas mãos estavam geladas. Tão frias que eu ainda hoje tenho a sensação do toque gelado quando me lembro desta história. Meu pai parecia muito assustado e zangado tentando acalmar minha irmã para que ela contasse o que havia ocorrido, enquanto minha mãe, sempre solícita nesta hora já trazia um copo com água e açúcar e insistiu para que Juliana a tomasse para “acalmar os nervos”.

Quando ela se acalmou começou a relatar o que havia ocorrido, enquanto nós nos ajeitávamos no sofá, curiosos por ouvir o que ela tinha a dizer. Foi narrando os fatos e às vezes entrecortava a sua fala com um soluço enquanto minha mãe que a havia abraçado afagava a sua cabeça. Dizia que antes de dormir resolvera rezar, e todos se entreolharam com estranheza já que ela não era nada de rezas. Abraçou os joelhos com as mãos e sempre apoiada por minha mãe continuou a contar que enquanto estava rezando sentiu uma mão “misteriosa” pousar sobre a sua. Num impulso pensou em recolher as mãos, mas uma ideia a deteve: Se estava rezando então deveria ser um anjo e por um instante seu coração se encheu de alegria. Foi então que sentiu com surpresa um primeiro beliscão e recolheu a mão instintivamente, porque logo sucederam outros.

Assustada, pulou da cama e foi até a escrivaninha de madeira onde havia duas gavetas e um espelho em formato elíptico. Sobre a escrivaninha encontrava-se um pequeno vaso onde murchavam meia dúzia de rosas que ela apanhara na manhã anterior no jardim em frente a casa. Numa das gavetas pegou um evangelho espírita, que se encontrava perdido entre alguns papéis, com a intenção de fazer uma prece. Enquanto tentava ler o evangelho, a porta do quarto fechou-se com força como quando alguém zangado bate uma porta e embora ela tentasse deixar a porta aberta por três vezes o espírito ruim ou sei lá que outra força atuasse ali naquele momento a impedia, batendo a porta com fúria. Na quarta tentativa, ela escorou a porta com a cômoda, deixando cair o vaso que partiu no gargalo e espalhou as rosas pelo chão. Mas obteve sucesso em deixar a porta aberta.

Já lhe tremia o corpo todo quando corajosamente tentou retomar a leitura do evangelho, mas era interrompida, pois sentia o tempo todo seus cabelos serem remexidos e a luz acendia e apagava como se houvesse ali uma criança invisível ou um espírito zombeteiro lhe pregando peças. Não suportando mais, pulou da cama e correu até o quarto de meus pais batendo desesperadamente na porta e foi quando todos nós acordamos.

Este, sem dúvidas, foi o fato mais estranho que aconteceu com a minha família. Acredito em espíritos, mas não sou uma crédula tola que atribui tudo o que acontece a nossa volta e não podemos explicar a obras de espíritos. Quanto ao fenômeno ocorrido com minha irmã eu posso dar fé como testemunha, pois presenciei uma parte da situação narrada por ela, então posso afirmar, a menos que a nossa família tenha sofrido de um caso de alucinação coletiva ou algo assim, que o que ela disse era bem real.

Segundo minha mãe que é espírita, a qual eu considero muito sábia pela sua vivência e observação das coisas, naquela época, minha irmã estava mal acompanhada espiritualmente, pois passava por uma fase de rebeldia, demonstrando ingratidão para conosco que a amávamos e era muito briguenta e turrona. Esta experiência fez com que ela refletisse um pouco sobre suas atitudes e se tornasse uma pessoa melhor, voltando novamente a respeitar os valores familiares.

Naquela mesma noite e a partir de então, minha irmã ficou por um longo tempo dormindo no meu quarto e estendia o colchão ao lado de minha cama. Ela, que tanto brigava comigo! E por um bom tempo dormi imersa até o último pelo da cabeça sob os lençóis.


Inspirado nos relatos da amiga e professora Silvia Canônico da cidade de Araraquara

Agnaldo Garcia

sexta-feira, 8 de abril de 2011

O Vento Finalmente

Sem dúvida nenhuma a culpa é do vento.

Porque tem dias que a gente levanta de manhã com a mente tão esvaziada e agradece a Deus por que não pode pensar em nada e nem quer pensar em nada e assim não se aborrecer ou ficar triste com nenhuma lembrança deste recorte de situações interrompidas pelo passeio do sol pela esfera terrestre que nós chamamos de dia. Só no café fumegando no coador e mesmo assim por causa do cheiro fresco que ele exala e rescende por toda a casa trazido pelo vento e daquele prazer quase sexual que a gente sente quando ele amargamente desce goela abaixo depois de embaçar a lente do óculos. Fora isso a mente segue tão vazia quanto o estômago antes que eu engula o primeiro pedaço de pão mastigado as pressas por causa da quentura do microondas. E a gente nem se importa com a margarina derretida que escorre pela boca. E o silêncio que reina ainda nestas horas da manhã, fora aqui ou ali uma briga de pardal por algum inseto que serve de breakfast, ou os casais de maritacas felizes propagando aos quatro vento o seu eterna estado monogâmico. Momentos em que a gente sente uma melancolia de vontade de não estar aqui mais sem saber porque estes pensamentos pegam a gente assim porque ainda não existe o vento soprando e trazendo os sons baixinhos lá de fora além da luta belicosa dos pardais e o canto de felicidade das maritacas. O sol ainda tímido desponta frio num verão tórrido como estes últimos. Surpreendentemente procuro o sol sob minhas costas, porque nesta manhã o vento que ainda não veio aqui dentro pela janela resfriou o verão escaldante.

O vento sempre acaba soprando em algum momento. De surpresa e muito rapidamente como tudo que há de bom na vida, ocorre assim sem que possamos nos dar conta de que ocorreram e possamos tirar o máximo de proveito deles. E depois só fica uma saudade melancólica que teima em provocar uma dorzinha incômoda lá na “pontinha do coração”. Dor, que se pudesse ser traduzida num desabafo, daqueles que a gente, sem pensar, despeja para o mundo direcionado ou não, de vez em quando, sairia mais ou menos assim: “Nunca mais eu igual”. Ele sempre trás coisas de longe, como aquele tecido branco que insiste em flutuar sobre o éter a minha volta e como um véu compromete a minha visão. E nestes momentos a gente só pode é fechar os olhos e ver as coisas pelos olhos do coração, me arrancando de mim e prometendo que eu nunca mais vou sorrir a vontade sem que algum músculo contraído da minha face marque um ponto perdido de saudade nos rincões do tempo. Que apesar de tudo de bom ou de ruim que eu irei atravessar certas lembranças impregnadas ficarão como aquelas fotos antigas que, desgastadas pelo tempo, desbotam mais ainda mas conservam registradas pixels de memória de um instante congelado e precioso e que mesmo que nós pudéssemos apagar de nossas mentes e corações não íamos querer porque assim pareceria cometer um pecado imperdoável contra a maior de todas as forças do cosmo.

Só o vento soprando assim. Um vento carregado de umidade nestes dias de verão absurdamente quentes trouxe uma lembrança triste de lugares em que eu nunca estive e momentos que eu nunca vivi. Como aquela música que a gente houve pela primeira vez e conversa com a nossa alma. E nos faz perceber coisas que surpreendentemente eram tão preciosas e estavam o tempo todo conosco, mas nem nos dávamos contas.

O vento me lembrou de um sonho terrível de morte que eu tive esta noite. E dele acordei pelas três da madrugada, suava de agonia. Levantei fui até a cama de minha filha, apalpei a sua testa e apoiei as costas de minha mão como a verificar que o sonho que eu tivera não havia sido um prenuncio ruim. E fiquei ali durante um tempo ao pé de sua cama lembrando de todas as expressões de sua face, de momentos bons de ela sorrindo feliz ao meu lado. Remoendo instantes em que eu me julgava realizando coisas muito importantes que não lhe pudesse dar a atenção merecida e um sentimento de remorso me tomou por algum tempo. Então toquei mais uma vez a sua fronte, beijei-lhe a testa cheia de cabelo e tentei por alguns longos minutos retomar o sono porque amanhã afinal, tudo começa mais ou menos como no dia anterior, já que a impressão causada por este sonho vai ficar marcada em minhas lembranças, mas desaparecerá um dia como a onda formada por uma pedra lançada sobre a água.

Pela manhã depois de tomar meu café a acordei com um beijo e me retive num pensamento deveras desconfortável. Que o que eu vi no sonho poderia acontecer, eu poderia perdê-la a qualquer momento e por isso a segurei com mais força quando ela ressonando e de mau humor como agora todos os dias de manhã tentasse se livrar do meu abraço. Eu sorri agradecendo a Deus que eu a tivesse ainda ali comigo.

Lembrei-me do meu tio e só agora eu pude de leve dimensionar toda a dor que ele ter experimentado quando perdeu seus filhos. Eu nunca havia dimensionado como isto pode ser terrível para alguém até então e eu nem havia me dado conta disso. Este pensamento me fez ir até ela e abraçá-la muito forte até que ela reclamasse e me afastasse num gesto de protesto.

Uma amiga que escreve muito bem me mandou uma mensagem de aniversário hoje, embora meu aniversário seja daqui a alguns dias. Às vezes a gente tem coisas a dizer que não precisam esperar datas especiais, como aquelas roupas, as melhores, que guardamos sempre para ocasiões especiais e quase nunca usamos. Talvez nem haja tempo para usá-las.

A gente vai vivendo e conhecendo pessoas sem o menor “fair play”, mas quando encontra algumas que dão “show de bola” no jogo da vida é impossível não se encantar. Pessoas que conhecemos a tão pouco tempo, mas que já apreciamos tanto que quase faz crer que em outros tempos ou reencarnações nos foram muito familiares, como uma irmã, um tio ou o avô gente boa.

E como você disse neste recado singelo minha amiga, depois dos 40, 41, precisamente aos 42, tudo parece mudar, permanecemos olhando para trás um bom tempo e nos habituamos tanto a isso que nem vemos as pedras no caminho e tropeçamos um monte de vezes de forma que nossos joelhos e cotovelos vão ficando em carne viva. O lado bom disso é que vamos aprendendo a nos levantar cada vez com mais dignidade e graça e as feridas vão criando casca de maneira que depois de algum tempo, uma casca dura protege de feridas novas. Acostumamos-nos também a torcer para que estas pedras amoleçam e se firam como nós, não por vingança, mas para que aprendam com os erros e sofrimentos. E vamos, apesar de moles, nos lapidando como os duros diamantes e nos tornando capazes de sentir a dor dos outros, quando os escorpiões são cruéis com quem estimamos e assim , sabendo que sempre vamos encontrar estas pedras por amolecer no caminho, seguimos procurando esquecer o futuro incerto.

Já sabemos um tantinho da vida, sabemos olhar e definir o quão importante é ou não aquela, aquele ou aquilo.

Sei que você ainda é bem jovem e tem a pele grossa ainda, rsrsrsrsrsrsrs... Mas desde quando cronologia define a verdadeira idade, não é? Afinal, a passagem do tempo de forma contínua é pura invenção dos homens. Já ficou uma hora no dentista? É igual a uma hora num quiosque tomando umas com os amigos?

E é assim mesmo que a vida segue, descobrimos que nossos herois, aqueles que pareciam ter a capacidade de salvar o mundo, ou pelo menos o nosso time do coração, são tão humanos como nós, brigando contra a balança ou um hipotireoidismo. Por um tempo tudo parece irremediavelmente sem solução. Temos a impressão de que o mundo inteiro vai desabar sobre nossas costas. Depois tudo melhora, até o Corinthians... Nesta montanha-russa gigante que é a vida.

Agnaldo Garcia