quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Hecatombe, a Profecia do Fim



Agosto, mês de seca. Quando a natureza se ressente da falta d’água e torna a paisagem cinzenta e o ar se enche de poeira tornando difícil, às vezes um simples exercício como respirar. Mas o fato de existir pouca umidade permite um céu sem nuvens e a noite apresenta um belo espetáculo para aqueles afortunados que não vivem nas grandes e poluídas cidades que são as nossas metrópoles. Numa noite dessas estreladas de cidade do interior, na varanda observando as constelações, Alberto pensou que há milhares de anos atrás outras pessoas olhavam para o céu e viam as mesmas e regulares estrelas que mirava agora no céu. A constelação de escorpião, as Três Marias que fazem parte da constelação de Órion se afiguravam destacadas pela falta de luminosidade da lua nova. Foi então, pela primeira vez que ele notou aquela estrela peculiar que não parecia estar ali na noite anterior. Nas noites que se seguiram, postado na varanda, a estrela parecia intensificar o seu brilho até se tornar mais brilhante que Júpiter ou Vênus, planetas que emprestam e refletem o brilho do sol e os vemos nos céus como as estrelas mais brilhantes em certas épocas do ano. Curioso buscou na rede mundial imagens de planisfério celeste e não encontrou nenhum astro de brilho considerável naquelas coordenadas celestes. Mas a realidade era contundente em mostrar o ponto luminoso visivelmente cada vez mais fulgurante. Vieram dias mais atribulados em que já não tinha mais ânimo para contemplar o céu de seu quintal. As urgências da vida, doença na família o levaram por um bom tempo a ignorar o astro curioso. Nem mesmo se deu conta, quando rumores começaram a se espalhar na internet fazendo menção sobre a estranha estrela que a olhos vistos e nus parecia cada vez maior. Sugeria algum objeto consideravelmente grande e que se aproximava vertiginosamente da atmosfera terrestre. Como o assunto se espalhou e tomou conta de toda a mídia mundial os governos se apressaram em desmentir que um cometa ou asteróide gigante estivesse em rota de colisão com a terra. A explicação era simples: Uma estrela havia explodido transformando-se em uma supernova.

Ocorre que a explicação dada não convenceu e em pouco tempo, o pânico tomou conta das pessoas em todo o mundo. Os governos enfim diante das indubitáveis evidências, proclamaram o veredicto. O fato tinha data precisa para ocorrer. Segundo os cientistas, o evento catastrófico ocorreria no dia 13 de setembro daquele ano na costa leste da África, às 19 horas e vinte e quatro minutos do horário de Brasília precisamente e não havia nada que pudesse ser feito. Segundo os mesmos, o astro brilhante tratava-se de um imenso asteróide de cerca de 40 quilômetros de diâmetro, o dobro do tamanho daquele que atingiu a planície de Yucatan no México há 65 milhões de anos e varreu os dinossauros da face da terra. O mundo inteiro seria devastado por terremotos no top da escala Richter. O planeta todo seria atingido por detritos levantados durante o impacto e imensos tsunamis varreriam as costas dos países onde se concentram a maior parte da população mundial. Ventos de mais de 500 Km/h causariam estragos inimagináveis.

Tais informações vinculadas nos principais meios de comunicação caíram como uma bomba, como se o impacto já houvesse ocorrido. Um estado de calamidade pública se abateu durante os primeiros dias sobre toda a humanidade. Alberto já havia dias antes se reunido com sua família para decidirem juntos o que fazer. A decisão foi unânime. Não fariam nada. Ficariam juntos onde estavam até o fim. Não havia lugar nenhum mais seguro do que o interior de casa naqueles dias. Nem transporte coletivo ou próprio poderia ser usado já que as estradas se encontravam intransitáveis devido aos imensos congestionamentos, carros quebrados e abandonados no meio das vias e outras barbaridades cometidas por bandos ensandecidos. Ninguém vendia mais nada, comprava, enfim todos só pensavam no fatídico dia. Alberto juntou os dois filhos adolescentes e a esposa e reforçaram janelas e portas com madeira e prego. O vizinho lhe deu uma arma calibre vinte e dois que ele pediu a Deus que nunca precisasse usar. No dia seguinte deu um tiro na direção da porta que era forçada por umas duas ou três vozes enlouquecidas. Depois disso, silêncio nos dias que se seguiram. Em 12 de setembro Alberto e a família diante da quietude resignada das ruas resolveram “apreciar” o espetáculo do dia seguinte em grande estilo. Com mantimentos roupas e duas barracas para passar a última noite neste planeta subiram num monte ao pé da cidade e acamparam junto a mais duas famílias que lá já se encontravam. Na noite de 12 de setembro o asteróide se afigurava imenso no céu e pequenos pedaços partidos transformavam a noite. Parecia o céu de outro planeta.

Lindo espetáculo! Pensou e lhe acentuou o frio na boca do estômago. Naquela noite não pode dormir. Sentia de alguma forma um terrível sentimento de impotência diante dos fatos e seu instinto de proteger a família contra os perigos o fazia sentir-se mais impotente e miserável. Olhou para os filhos e a esposa que dormiam amontoados próximos a fogueira e acalmou um pouco o coração. Nada podia fazer! Era fato. Ao menos estava junto das pessoas as quais ele mais prezava. Era assim, que se pudesse escolher, de qualquer forma teria terminado os seus dias. Eram altas horas da madrugada quando finalmente foi vencido pelo sono. Sonhou que o asteróide mudara de rota e atingira a lua. No sonho as pessoas do mundo inteiro se abraçavam e choravam de felicidade.

Acordou com a luminosidade do dia. A fogueira apagada deixava o ambiente frio em volta e ele cobriu melhor um dos garotos que dormia encolhido. Durante o dia todos procuraram ficar o mais próximo uns dos outros, mas quase não havia ânimo para as habituais conversas. Sua mulher mal continha as lágrimas quando olhava às vezes para um dos filhos ou para Alberto. O tempo parecia fluir mais depressa como que para apressar o mundo para o terrível desfecho.

Cinco horas, cinco e meia, seis e meia... O sol se punha e Alberto olhou para o céu e estranhou por algum tempo que a estrela da morte não estivesse lá. Mas compreendeu em seguida que ela já se encontrava além da curvatura da terra se aproximando do ponto de impacto.

Sete e vinte e três, sete e vinte e quatro da noite... Alberto e a família estão em pé abraçados quando um súbito clarão ilumina o céu a partir do leste. As crianças e mulheres das três famílias reunidas gritam e choram. Em seguida, exceto alguns soluços quase inaudíveis, o silêncio é quase absoluto. Os ânimos se acalmam até que cerca de vinte minutos depois a terra começa a chacoalhar de maneira indescritível. Todos são jogados ao chão e o desespero toma conta de novo. Quinze minutos depois todos ouvem um barulho que parece chuva caindo e o céu fica escuro. Logo todos percebem apavorados que se trata de material ejetado pelo impacto do asteróide. Por sorte ninguém é atingido. Novamente depois de algum tempo os ânimos se acalmam.

Passam-se horas de apreensão e agonia. As crianças se animam imaginando que o terror acabou e que todos poderão retomar as suas vidas. Algumas mulheres e homens, cientes do próximo terrível evento, não se contém e se debulham em lágrimas e lamentações. Alguns como Alberto, permanecem resignados esperando à hora terrível.

Passados 32 minutos do dia 14 de setembro, Alberto e os outros que ainda estão acordados vêem no horizonte a leste surgirem terríveis nuvens de tempestades elétricas que trazem consigo ventos com mais de 400 km/h. É o fim de todos. Alberto se reúne à família. As rajadas chegam e arremetem todos do solo.

Um ano após o incidente são poucos os que ainda sobrevivem. Uma nova era glacial se instalou sobre a terra, transformando-a numa bola de gelo.

Agnaldo Garcia