quinta-feira, 21 de julho de 2011

A Tempestade


Havia apenas um mormaço quente e o calor do sol ardendo na pele, prenúncio de um dia úmido de verão. O céu azul e limpo pela manhã, cobriu-se rapidamente de nuvens, inicialmente esparsas e brancas, depois se adensando e transformando-se em enormes chumaços azuis escuros, por causa da grande densidade de vapor. Relâmpagos passaram a riscar o céu em intervalos contínuos e a terra exalava aquele cheiro característico quando molha. O vento suave de brisa soprou mais forte trazendo respingos de chuva. Poeira e folhas de árvore espalharam-se pelo ar e o dia fez-se noite.

Eu, assustado, fechei portas e janelas aguardando impotente que o aguaceiro parasse, instinto primitivo de continuar vivo.

Choveu e muito. O granizo pipocou sobre o telhado e redemoinhos de vento retorceram árvores e destelharam casas. Jatos de água intermitentes atiravam-se pela janela respingando no sofá da sala.

Choveu assim, por horas. Depois a tempestade arrefeceu e a noite foi “endiecendo” novamente até que apenas podia-se ver um barrado azul no horizonte. Um arco-íris duplo arqueou no céu com o sol se pondo, o granizo derreteu deixando o dia mais frio que o normal para esta época do ano. Pássaros voltaram a chilrear nas árvores, sacudindo suas penas e atirando longe respingos de água. Da tempestade restou apenas uma lembrança ruim e um sentimento de alívio...

No início, logo após a tormenta, eu me acostumei a olhar para o céu sempre remoendo a procura de indícios que me mostrassem quando outra adviria sobre mim derramando sua fúria, instituindo caos à quase calma reinante, subvertendo a ordem dos astros e trazendo escuridão quando deveria haver luz. Eu buscava amedrontado estes sinais. Uma formação de nuvens, cirros-estratos, cúmulos nimbos ou outras, cujos nomes em latim eu esqueci como relacionar às formas. Observava à tarde se o céu se cobria de vermelho no poente ou molhava o dedo entre os lábios e o estendia para cima procurando um vento que costuma soprar lá do sul e trazem as frentes frias. Assim eu poderia me precaver. Talvez, quem sabe...

Eu queria acreditar que não haveria mais tempestades como àquelas, inundando o meu mundo. Trazendo confusão à calmaria. Que só restariam os resquícios e mesmos estes, aos poucos deveriam desaparecer com o passar do tempo, tornando-se raras lembranças como objetos numa caixa velha de papelão que vez ou outra fuçamos saudosos.

Eu queria acreditar que outras não virão. Derrubando árvores, destelhando casas e inundando as ruas. Mas no fundo eu sei. Aquela primeira tempestade foi só uma conseqüência menor de uma mudança climática irreversível. Que outras maiores ocorrerão trazendo mais destruição. O que me resta é segurar firme no barco do hoje e seguir vivendo um dia de cada vez com a pouca fé que ainda me resta. E agradecer a Deus quando me levantar de manhã e o sol estiver brilhando num céu azul e só soprar uma brisa fresca, daquelas que secam o suor que teima em escorrer pela face.

Hoje só há a calmaria.

Aquela típica mansidão dos elementos que prenunciam uma terrível tempestade...


Agnaldo Garcia


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